NBC TA 510 – Trabalhos Iniciais – Saldos de Abertura
- Luiz Viana

- 20 de nov.
- 5 min de leitura

NBC TA 510 – Trabalhos Iniciais – Saldos de Abertura
Em uma auditoria inicial, o ponto de partida é o passado.Os saldos de abertura — extraídos do exercício anterior — formam a base sobre a qual as demonstrações financeiras atuais são construídas.
Mas quando o período anterior não foi auditado (ou foi auditado por outro profissional sem continuidade técnica), o auditor precisa aplicar procedimentos adicionais para obter asseguração razoável de que esses saldos não contêm distorções relevantes que afetem o exercício corrente.
A NBC TA 510 fornece o arcabouço técnico para essa verificação, reforçando que o auditor deve:
Avaliar se os saldos de abertura são livres de distorção relevante;
Verificar a consistência das políticas contábeis;
E confirmar se as informações comparativas estão adequadamente apresentadas.
🎯 O que a norma estabelece
1. Compreensão dos saldos de abertura
Os saldos de abertura incluem:
Contas patrimoniais e de resultado acumuladas;
Ajustes de exercícios anteriores;
Contas transitórias e provisões herdadas;
Informações comparativas apresentadas nas DFs.
O auditor deve compreender como esses saldos foram formados e se refletem corretamente as políticas contábeis da entidade.
2. Quando o exercício anterior foi auditado por outro auditor
Caso exista auditoria anterior, o profissional atual deve:
Ler o relatório de auditoria anterior e identificar possíveis ressalvas;
Avaliar a natureza das distorções apontadas;
Comunicar-se, quando possível, com o auditor predecessor para compreender limitações e pontos críticos;
Obter evidência sobre a correção de ajustes ou recomendações anteriores.
3. Quando o exercício anterior não foi auditado (ou não há continuidade técnica)
Este é o cenário mais desafiador e de maior risco para o auditor, pois não há base independente de confiança.A NBC TA 510 orienta que, nesse caso, o auditor precisa obter asseguração razoável por meio de testes adicionais de abertura, aplicados de forma direcionada conforme a materialidade e a significância das contas.
🔹 Foco em áreas de maior risco e materialidade
A seleção dos procedimentos deve priorizar as contas de maior risco de distorção e impacto material nas DFs.O raciocínio segue a lógica da NBC TA 315 (avaliação de riscos) e NBC TA 320 (materialidade):
Quanto maior o risco ou a complexidade, maior a profundidade dos testes de abertura.
Contas de baixo risco e baixo impacto podem ter cobertura analítica simplificada.
Exemplo prático de hierarquização de foco:
Área | Natureza do risco | Abordagem esperada |
Caixa e bancos | Risco de existência e integridade | Circularizações e reconciliações completas |
Contas a receber | Risco de existência e corte | Circularizações, recebimentos subsequentes, revisão de aging |
Estoques | Risco de superavaliação e obsolescência | Observação física e reconciliação documental |
Fornecedores | Risco de passivos não registrados | Circularizações e análise de pagamentos posteriores |
Provisões e contingências | Risco de julgamento inadequado | Revisão documental, circularização de advogados e análise jurídica |
Imobilizado | Risco de registro indevido ou valor não atualizado | Inspeção física e teste de depreciação |
Patrimônio líquido | Risco de ajustes indevidos ou lucros acumulados incorretos | Revisão de atas, deliberações e mutações patrimoniais |
🔹 Procedimentos adicionais para asseguração razoável
Os procedimentos de auditoria aplicados aos saldos de abertura podem incluir (NBC TA 510.06 a 510.08):
Circularizações externas (NBC TA 505):
Bancos → saldos, aplicações, financiamentos e garantias;
Clientes → valores a receber, glosas e créditos vencidos;
Fornecedores → obrigações, duplicatas e notas em trânsito;
Advogados → ações judiciais, risco de perda e contingências não provisionadas.
Conciliações detalhadas:
Bancos → reconciliação completa com extratos do último mês do exercício anterior;
Clientes/fornecedores → conferência com relatórios de contas a receber/pagar e documentos de suporte;
Tributos → reconciliação entre saldos contábeis e declarações fiscais.
Inspeções físicas e documentais:
Inventário de estoques → observação física e teste de contagem;
Ativos imobilizados → inspeção de bens, análise de notas fiscais de aquisição e depreciação acumulada.
Reexecução de cálculos:
Provisões trabalhistas, férias, 13º, depreciação e encargos sociais.
Reaplicação de taxas, percentuais e bases legais para verificar consistência dos valores.
Análise de eventos subsequentes (NBC TA 560):
Verificar se fatos ocorridos após a data-base de abertura (pagamentos, liquidações, baixa de estoques) confirmam ou contradizem os saldos registrados.
Revisão analítica comparativa:
Avaliar tendências, margens e variações significativas entre o exercício anterior e o atual, especialmente quando há indícios de distorções acumuladas.
🔹 Critério de materialidade e asseguração
A materialidade definida para o exercício corrente deve ser usada como referência base na avaliação dos saldos de abertura.O auditor precisa considerar que:
Pequenas distorções acumuladas em saldos iniciais podem, somadas, tornar-se relevantes no exercício atual (NBC TA 450);
A materialidade de execução (PM) deve ser ajustada para compensar a incerteza de saldos não auditados;
A asseguração razoável é alcançada quando o auditor obtém evidências suficientes, de fontes confiáveis, que reduzam o risco de distorção a um nível aceitavelmente baixo.
📌 Exemplo:Em um hospital de pequeno porte sem auditoria anterior, o auditor define materialidade global em R$ 120 mil e PM em R$ 96 mil (80%).Ao testar saldos iniciais, ele identifica diferenças de R$ 60 mil em provisões e R$ 25 mil em fornecedores, mas demonstra que os ajustes não afetam o resultado do exercício corrente acima da materialidade.Esses achados são documentados nos WPs com referência cruzada à NBC TA 450 (avaliação das distorções).
🧪 Exemplo prático ampliado
Imagine uma clínica médica auditada pela primeira vez.O auditor identifica ausência de conciliações e reconciliações incompletas em contas críticas.Para obter asseguração razoável, o plano de auditoria inclui:
Circularizações bancárias e de clientes para confirmar saldos iniciais;
Revisão de contratos de prestação de serviços médicos e convênios para validar receitas e obrigações;
Reexecução de provisões trabalhistas e encargos, comparando bases salariais e encargos recolhidos;
Análise de recebimentos subsequentes, validando a integridade dos saldos de contas a receber;
Avaliação de consistência contábil, comparando margens e despesas fixas com o histórico setorial.
Após os testes, foram identificadas diferenças não materiais, documentadas nos WPs e ajustadas pela contabilidade.A asseguração razoável foi atingida: o auditor obteve evidência suficiente e apropriada de que os saldos de abertura não continham distorções relevantes que comprometessem o exercício atual.
📁 WPs (Work Papers) – o que deve constar
Descrição dos saldos de abertura e riscos associados;
Procedimentos adicionais aplicados;
Evidências coletadas e resultados;
Avaliação da materialidade e impacto sobre o exercício corrente;
Conclusão sobre asseguração razoável.
📌 Conclusão
A NBC TA 510 é uma norma de transição — do “antes” para o “agora” — e exige do auditor olhar histórico, rigor técnico e julgamento profissional.A asseguração razoável nos saldos de abertura depende de planejamento direcionado, testes substantivos robustos e avaliação proporcional à materialidade.
Mais do que validar números, o auditor precisa reconstruir a confiança nas demonstrações, garantindo que o primeiro relatório reflita, com segurança, a real situação patrimonial e financeira da entidade.
➡️ No próximo artigo da série, abordaremos a NBC TA 520 – Procedimentos Analíticos, explorando como as análises comparativas e indicativas auxiliam na identificação de distorções relevantes e na eficiência da auditoria.
🔎 Série Especial | NBC TAsPor Luiz Viana – Sócio de Auditoria na VORCON Auditoria e Consultoria




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